quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Gestos de des/amor

 Não se sentir em casa, em lugar algum...

Poderia ser poético, alma viajante, a casa é o mundo, mas não. Para que o mundo fosse seu lar, o abrigo que tem no peito tem que ser ilimitado, como a maneira como se sente amado. E não é sobre amor, mas sobre sentir falta...

Qualquer lugar do planeta é hostil, com quem não tem onde se referenci(ar)... É não ter por quem gritar no desespero, e guardar poucas lembranças boas e muitas histórias de despejo, solidão,abandono.

Aguentar essa carga é desumano. Tira até a delicadeza da alma de bichos, que são muito cedo expostosa aos intempéries das matas. Embora sua natureza, faça-os mais fortes perante a solidão, mas não menos sofridos e amedrontados quando estão fugindo do desamor humano.

E neste instante assemelho a incapacidade de amar à raiz da violência. Quando a agressão transborda e descaracteriza a vida revelando o inani(mato). Assim que a morte domina a cena e o que desliza por cada via do organismo é frieza, malícia, mentira e deixa o outro em destroços.

Essa capacidade de odiar também engendra o que anima o ser. A dose desse veneno amarga os sonhos e constrói os pesadelos mais terríveis: todos desejos que o sangue envenenou com pura maldade.

É sobre o que é familiar na vingança, no ciúme, na cólera, na solidão, no desassossego, e esfria o peito com a dor mais conhecida: aquele dia em que o desespero não viu o colo que merecia.

No adulto essa semente já está germinada, em alguns suas raízes sedentas correm pelo corpo-alma em busca de todos os líquidos-desejos e os desidrata.

Na criança essa semente é plantada, o quanto que é regada pelos que lhe acolhem, ou não, fazem esse fruto maldito destruir a capacidade de folh(ar), flo(rir), cres(ser)...

A falta de cuidado que o desumano semeia, vem da sua incapacidade de assumir que cresc(eu). Tem irresponsabilidade em demasia impedindo o cultivo do outro na sua vida. É um ser solitário por indecisão, e neste sentido quer dizer: por não querer decidir, por abrir mão de escolher.

Está naqueles que gastam atitudes ao léu, brindam o destino, porque ele alimenta a covardia voraz, que os consome. Justamente isso, tem força e poder de destruição dentro do que se acovarda em tudo.

Todavia, a vida, habit tão antigo quanto o pó pra onde vamos, é a força de amor e cria, isto é, tem potência como todo início. Porisso também reconstrói, revitaliza e redireciona o sentido. É capaz de recomeços, como a capacidade humana de inventar histórias a cada reencontro com a pena, a página em branco e os novos habitantes dos seus delírios, sonhos e círculos de convivência.

Convivas, neste mundo da dependência sexual de ter alguém. Embora sempre perdidos de amor por quem nos abrigou por vontade, por desejo, ou sem querer.

O mapa que aponta nosso desejo mais íntimo são as atitudes, canções, narrativas e histórias do que era estranho e familiar na infância. Do que foi contado e cantado enquanto não sabíamos onde estávamos, quem éramos,  e se em algum momento soubemos quem nos amava a cada gesto.

H. C. Q. F de 4 de fevereiro de 2021


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