domingo, 20 de setembro de 2020

N

Se sentir amado, é saber que não há uma condição para que deixe de sê-lo. 
Não existe o medo de errar, mas existe o medo de perder... Uma das ambiguidades que cabe no amor.
Ele entrega ao amado ser uma aceitação tão grande, que os erros fazem parte, os defeitos também...
Fora do amor, errar faz doer e partir...
Dentro do amor, errar faz aprender e amar ainda mais...
Vendo um episódio de Anne, senti a dor da pequena órfã ao ser devolvida ao orfanato, devido a suposição de furto. Exatamente aí não cabe o amor...
O medo de ser devolvido... O deixar de pertencer...
Por isso ser amado é tão constitucional, constrói parte importante da nossa identidade, aponta onde podemos ser encontrados e para onde podemos voltar...
Não caber mais num lugar, que alguém disse que você teve, faz perder o sentido de amado ser.
Devolver alguém também faz o sentido de amante morrer.
Se você ama pelo que a pessoa é, existe essa condição, não é amor.
Se você é amado pelo que tem, existe uma condição, não é amor.
Se existe amor diante da dor, também não é amor...
Amor é o que permanece depois de tudo: depois que o tempo passa, que a situação muda, que o temperamento se intensifica, em meio a doença e a saúde.
Não é amor o que traz saúde, isso é remédio,ou boa alimentação.
Não é amor o que faz sofrer, não seria, amor é o que passa horas e dias com doer e com alegria...
O amor é ambivalência, polissemia, paradoxo, ambiguidade, distopia...
Faz sofrer e chorar, também sorrir e cantar.
É amor quando é todo dia.
H. C. Q. F. 20 De setembro de 2020.

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

Presença na saudade

Sempre tive saudade em mim...
Como se fosse parte dos meus órgãos do sentido...
Sempre foi sinestésico: sabor de saudade, cheiro de saudade, som da saudade...
Agora encontrei seu nome em mim.
E de tão alva presença que me ilumina mesmo na ausência... 
É Lu(is) de dia e de noite... 
E se não está comigo é inteiro saudade, porque perto dele o presente é pleonasmo.
E o passado é anacrônico, revejo-me criança.
E o futuro é paradoxo, já que não o vejo nas minhas atitudes adultas, posto que lhe quero mais sábio e mais feliz.
É o meu sonho em vigília contemplado... 
Mas também pesa não poder estar com.ele.sempre.perto... 
Desejo que ele, qual presente de mim se lembre.
Diz a canção: "Eu tenho medo, mas sei que isso é bom, é com o que conto pra sobreviver..." (Vital Lima - O Parkour)
H. C. Q. F,18 de setembro de 2020.

Indicação de música do YouTube:
Parkour - Vital Lima
https://youtu.be/hlrQUHXoeDg


quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Pres(ente)

Um dia, na adolescência dos meus dias, ouvi que estar ao meu lado seria o melhor presente de aniversário.
Algo inesquecível! Ainda agora me surpreende... Um frio, gostoso, toca o meu ventre...
Então de repente, quando eu disse:
- felicidades!
Ele disse:
- hoje eu só queria ficar o dia todo do teu lado.
Se sentir um presente para alguém não tem tamanho... 
Não cabe em um momento...
Não tem fim...
Não tem uma referência anterior.
É insuperável! 
Marcante como uma dor, que não flagela, mas corrói as defesas... 
Da pra sentir cada pedaço do medo de se entregar, de se envolver partir...
Fez sentir o quão singelo é tornar alguém amor.
Não está na matéria... 
Não tem um jeito certo de acontecer...
Não segue qualquer padrão...
Faz existir na mesma hora uma alma amada, que vira um manto, que de dentro para fora esquenta e envolve.
Cobre todo o corpo, no frio da saudade.
Es que nasce um abraço invisível que vira abrigo diante da sensação de vazio.
Tal que inaugura o sentir falta, que apesar de nascer antigo, ganha sentido e fundação. Daquele dia em diante, toda distância merece a existência do contrário. 
E eu ainda lembro do rosto que disse, do momento em que sua boca não exitou em entregá-lo, mas não foi tão fácil.
Ele abaixou a cabeça e só levantou pra dizer, depois abaixou pra sentir o que dissera, doeu em nós dois.
E agora parece que só sobrou a dor...
No entanto, é sempre agora, quando recordo desse amor.
 Sentir ser amada é eterno. Tal como ensinou uma estrangeira a Sócrates, segundo Platão.
Ser presente é deixar de ser instante.
Faz nascer o ser amante e o ser amado no mesmo ente.
H. C. Q. F. 10 De setembro de 2020.

sábado, 5 de setembro de 2020

Parar de sentir

 


Não sei como é deixar de amar alguém...

Nunca experimentei parar de sentir o amor que nem escolhi doar, mas nele me dei.

Como pedir de volta um desejo que foi para o outro? 

Não há como pegar de volta... 

Me peguei pensando em quantas vidas já amei e percebi que nem ao menos uma eu deixei de amar.

Ainda sinto a mesma alegria quando lembro dos dias lindos e ainda sinto a mesma tristeza por aqueles em que nos ferimos.

Pensei também se não seria melhor não pensar e então guardá-los em silêncio. Talvez fosse, mas não é...

São lembranças teimosas vem e vão embora quando um cheiro, um lugar, alguém faz lembrar uma cor, um detalhe...

E são esses detalhes que tornam o amor inesquecível. Cada pedacinho consagra o infinito. É que são tão miúdos, que nos dias em que os encontramos,o mais provável, é que nem percebemos que eles atracaram bem lá no fundo, onde é tão escuro que nem parece existir. Mas uma fagulha de luz já torna possível contemplar essa nossa profundeza.

E quando o vento da saudade sopra, eles se espalham pelo dia e cada canto da nossa história reaparece numa música que mexendo em uma playlist antiga, "sem querer", faz um grande amigo reaparecer; ou passando em frente a uma doceria, o cheiro de bolo de milho faz levar pra casa ao menos uma fatia do bolo preferido da avó mais querida... 

E cada recordação parece ao acaso, mas  bem no fundo, não é não... É saudade de nunca ter deixado de amar quem nos amou... 

Não dá para parar de sentir o que seu corpo, sua memória capturou do mundo para fazer parte da sua história.

É num caminho que se pega errado ir parar na parada incerta e fazer todo sentido ter chegado.

H.C. Q. F. 5 De setembro de 2020.