quarta-feira, 24 de junho de 2020

C(antigas)



Recobrir de afeto outro ser proporciona um encontro cuja intensidade é incontrolável. São emoções, fantasias e experiências que percorreram histórias diferentes. Por isso os "desencontros", como alerta Vinícius de Moraes. Há ainda o que caminhar, mesmo depois que o rio desaguou. São como os espelhos d'água o encanto que o amor encontra. Revestido de canções interiores, o a(mar) cintila como farol na madruga, sempre, a entoar  c(antigas).



Existe ainda uma química a se fazer presente depois que a natureza vigora... De quando os sentidos tomam conta da cena e protagonizam o rito ancestral. Dança que enlaça pelo beijo o corpo, da pele à carne e já não existe mais censura para o que a alma implora.



Tal que me ocorre, Carlos Drumond em seu poema, "Amar":
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
*
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o amar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
*
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho,
e uma ave de rapina.
*
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
*
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita."



Por vezes, é preciso, um coração partido para escutar o amor, que ao bater a porta, talvez como diria Drumond, "quando o amor bate a aorta" derruba os muros em volta.
(H.C.Q.F,24 junho de 2020)
*Imagens do Instagram @flowsofly

Nenhum comentário:

Postar um comentário