quarta-feira, 29 de setembro de 2021

O amor é um tipo de teste da vida

 A primeira vez que eu testei o amor... Foi logo quando o conheci e saboreei... 

Eu senti a doçura das nuvens tocarem a minha boca, como se eu tivesse provado um algodão doce azul... Assim mesmo...

Nunca alguém tinha se arrumado para me ver, nunca tinha sentido o privilégio de saber que o perfume que me lembrava alguém, tinha sido escolhido para me agradar e encantar...

Mas eu disse que não amava aquele cheiro, mesmo sabendo que me deixava desnorteada dentro do corpo...que me tonteava a alma numa alucinação de senti-lo sem enxerga-lo...

Neguei esse amor para poder ver se ele lutaria por mim, como eu estava lutando por ele contra a minha família, a minha classe social e a minha pretensão de não amar homem algum mais do que a mim...

Eu abri a porta do corpo dele, ofereci a inocência do nosso beijo pra uma mulher que eu admirava muito... E torci com todas as minhas forças, eu sonhei, sem dormir a noite inteira, que ele iria recusar... 

Nós já estávamos separados há meses, algo entorno de 6 meses... Mas eu queria a derradeira promessa de que eu seria a escolhida... De que ele me escolheria mesmo diante da beleza de Helen-a, porque ela não era a Hellen.

Depois ele voltou, ele negou... E eu quase perdi a amiga... Mas perdi ele, ele namorou e se deixou e me procurou e eu o deixei partir... Ele casou e encontrou do outro lado do mundo o abrigo que eu queria construir com ele.

Eu deveria ter aprendido que não sou insubstituível... Deveria ter aprendido na primeira Helena que atravessou meu caminho, a que teve a presença que eu tanto quis.. mas não aprendi... Que um presente pode ser perigoso... Que pode esconder uma guerra...

Testei o outro amor... O mais longo e arraigado em mim: o que eu temi demais testar, inventei outras formas de arriscar o que tivemos, só para não fazer o teste mais importante pra mim... 

Mas a maternidade me fez ser ainda mais eu, e aí, regredi a escolha que sempre faço diante do amor: vai e me prova que você está aqui porque você me escolheu...

Na minha fantasia, só outra mulher apaixonada é capaz de fazer o teste valer... Quer dizer, é preciso ver ele decidir rejeitar a outra mulher... E isso não acontece... De novo... E sempre...

Antes desse teve outro que eu também testei, mesmo antes de me declarar... Esse eu amei em silêncio, por covardia... Ficamos muito amigos e um dia, depois de tirar algemas que nem estavam trancandas, eu decidi tomar uma iniciativa: lutar por ele.

A primeira coisa que fiz foi apresentá-lo a uma garota... Uma menina que era meu oposto, mas da minha família, e que se ele ficasse, eu teria que conviver com o constrangimento dela ter sido pivô de uma desilusão amorosa minha.

Aconteceu... Ele escolheu ter um relacionamento furtivo com ela... Eles tiveram tanta intimidade e foi tão rápido e fulgaz quanto o envolvimento do meu primeiro amor e  minha amiga...

Porém com o tempo, as perdas foram ficando maiores... E como se eu tivesse dando ao amor um teste mais difícil: eu escolho mulheres mais afinadas com  os interesses deles... Algo sexual, algo estético, algo físico, que eu não esteja conseguindo oferecer... Eu mostro o que me falta no que a outra mulher tem e se o amor se apaixonar, é porque jamais suportaria conviver com a minha falta, com o m-eu desejo, com o que me dá sede de viver... A feminilidade que sempre me faz falta aos meus olhos...

Eu não poderia procurar isso que me falta em outra pessoa, mas eu ilumino quando reconheço em alguém: a beleza que me faltava aos meus olhos; a doçura que eu não sinto nos meus gestos; a juventude que eu vejo diminuir em mim; e agora a sexualidade livre que eu me impesso de exercer depois da maternidade...

Assim, falei dos líquidos encantos dos lábios do meu amor para alguém com muita sede; dei a espada para alguém com vontade de se vingar de mim cortar meu coração; abri a porta pra uma jovem gananciosa, na casa de uma senhora sem ambição.... 

E agora... Agora... Não sei nem como descrever sem uma metáfora que possa me redimir: ofereci um lindo abrigo confortável e familiar, para alguém sem critério... Que pouco caso faz da gentileza de um conforto pra alma, se puder desfrutar de luxo, glamour, status e qualquer mentira que traga algum lucro...

Talvez eu tenha enxergado o lado que o farol não se deixa iluminar... Talvez a briga toda por rechaçar a materialidade que envenena, se esconda no fundo do copo de martini que ele esbanja no fim de semana e que sei que tem gosto de luxo...

A luta que ele trava, não é uma luta que ele compra, talvez seja uma luta que ele venda, e que algumas pessoas compram... Mas nela, ele vai se revelar e eu vou mais uma vez perecer de descobrir o que me fez abrir mão: a mentira...

Sempre a mentira que eu me conto, a de que eu era a preferida... Essa eu até vivi com meu pai defeituoso, mas meu pai dos meus sonhos, ele me rejeitou pela Helena. Como se esse a, fosse a falta que me fez não ser escolhida, fosse a explicação, de que me falta alguma feminilidade...

Vivo o sonho de encontrar um homem que eu deseje e me torne meu próprio desejo no que me falta... Que reconheça essa minha natureza e veja a poesia que eu plantei nisso que é vastidão em mim...

Sinto força nesse vazio, como a energia que atrai para um buraco negro... Isso no início quando o encanto por mim se revela em música, poesia, flor, chocolate, conversa sobre a vida, o futuro, a família, uma vida inteira... 

Mas que me engole de sofrimento e loucura e eu começo a sentir o peso da minha história, do que eu não posso ser, do que eu tenho dificuldade de encarar nos meus defeitos e começo a desistir de viver o amor...

Eu quero que a proteção, a promessa de amor seja eterna (quem sabe um dia a paz vence a guerra e viver era só festejar...)... Mas eu sei que não dá pra ser assim... E eu sou a primeira a pular do barco, se eu não ver a praia no horizonte quando eu quero... Mesmo sabendo que a viagem seria longa, com tormentas, e dias de chuva... Eu quero ser aquela que vai ser embalada, que vai receber o colo... Sou exigente com o amor, tal como não sou com a própria vida, que eu não desprezo por ser difícil... Já o amor, esse eu fujo, desvio e desmoralizo, pra poder saber se é verdadeiro...

Cobro uma vida inteira de histórias mal-contadas, tornadas em fuxico, ao invés de serem relatadas por quem de direito para alguém com o peito aberto....

Indicação de música: never enough, do filme "o rei do show".

H. C. Q. F 28-29 de setembro de 2021





Nenhum comentário:

Postar um comentário