sexta-feira, 10 de julho de 2020

Papa e Mamá!



Zinaida Serebriakova


Quando um filho passa o dia trancafiado no quarto, em busca de privacidade: ele não quer ficar trancado o dia todo...
Quando um filho espera todos estarem dentro dos seus quartos para se alimentar: ele não quer ficar sem comer...
Essa é uma conversa sobre nutrir, mas o sentido está em "papa" e antes de tudo em mamá...
Uma conversa difícil... Guardada em segredo por filhas anorexas, adolescentes bulímicas, meninos obesos e pais narcisistas perversos.
Infelizmente existe!
Está escondido no mito da "doce mãezinha", do "pai provedor", do "amor de família"...
Exatamente isso: um "seio familiar" que, estranhamente, não alimenta.
Nas casas mais abastadas a miséria, nos lares miseráveis o "frio na barriga".
Não está nas finanças, mas nas cobranças o problema. Não está no que atinge, mas no que afeta. Não está no que se descobre, mas no que se recobre toda vez que essa lembrança constrangedora aparece.
Adultos infelizes, desonestos, desleais consigo, destemperados e assombrados por censuras cruéis. Crianças humilhadas por objetivos herdados; intimidadas por um "amor" viciado, perverso; tiranizadas por histórias alheias.
Ambos deveriam ter sido separados. Daí a importância de um divórcio não litigioso; da busca pela reparação diante do abandono emocional, mas nunca a convivência forçada.
Não é fácil ter sido forjado qual ferro moldado para espada, querendo ser cálice, a emudecer as sombras dessas batalhas. Talvez seja um "metal contra as nuvens"... que só em meio a altas temperaturas venha a ser capaz de se flexibilizar...
Todavia a distância afasta o trauma... Voar é o remédio mais difícil de encontrar... Cortado o fio que impedia a caminhada, já não vaga a alma apenada, absolvida dos crimes que não cometeu, ganha a pena capaz de escrever estrada, horizonte, alvore(ser).
A mesa já é capaz de servir, a comida capaz de nutrir, a boca capaz de falar, os olhos capazes de vislumbrar e a mente, livre, desve(lar).
Construir um lar começa quando há o corte no destino familiar. A herança não mais importa, é preciso conquistar a própria casa.
Talvez, perdoar em si o medo de ter filho e nele rever seus vilões e/ou apresentar a eles as mentiras que escutou sobre quem deveria ser amor e não foi.
Dar uma segunda chance para os a(voz) ou nunca mais permitir que segredos desleais sejam recontados?
É preciso vencer o receio de protagonizar uma tragédia familiar, que não é inédita, para assim gerar um laço amoroso.
Filho não salva, passado não se redime, futuro não se concretiza, pais e mães também ferem, presente é o que se ganha por estar vivo.
Que cada filho saiba que tem em suas mãos seu próprio valor... Que não há uma dívida por ter sido inquilino de uma dor gestada por 9 meses, nos quais ele não tinha como ser despejado, mas pode ter sido esquecido alí...
Que ele se lembre de si, em algum momento, e num "acorde" saiba que a música que embala sua alma -  por vezes de maneira a sufocar -, pode ser desligada, ou ganhar novos arranjos.
O coração é um maestro que pode está destreinado, mas seu talento para orquestrar os sentidos entorno do desejo pulsam e fazem jorrar - vida, amor, talento -, como a saliva quando dá "água na boca".
Música e comida são temas primordiais, por isso a arte é capaz de fazer a mente, mesmo esgotada, trabalhar. Se um som faz sentir um sabor e um gosto permite um cheiro tomar conta da boca, tudo é possível pra um corpo que (alma)haja. Almeje ser!

****
"Quase acreditei nas suas promessas
E o que vejo é fome e destruição...
E nossa história
Não estará
Pelo avesso assim
Sem final feliz
Teremos coisas bonitas pra contar
E até lá
Vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra atrás
Apenas começamos
O mundo começa agora
Apenas começamos"
(Metal contra as nuvens - Legião Urbana)

https://youtu.be/IDTs12pcvOM


H. C. Q. F. 10 De julho de 2020

Imagem Instagram: @inspiration_in_art

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